Publicada no Diário Oficial da União desta sexta-feira, 3 de julho de 2020 – Seção 1 – n.º 126, a Lei nº 14.019, de 2 de julho de 2020, que altera a Lei nº 13.979, de 6 de fevereiro de 2020, para dispor sobre a obrigatoriedade do uso de máscaras de proteção individual para circulação em espaços públicos e privados acessíveis ao público, em vias públicas e em transportes públicos, sobre a adoção de medidas de assepsia de locais de acesso público, inclusive transportes públicos, e sobre a disponibilização de produtos saneantes aos usuários durante a vigência das medidas para enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente da pandemia da Covid-19.
Oriunda do Projeto de Lei da Câmara dos Deputados, PL nº 1562, de 2020, de autoria do Deputado Pedro Lucas Fernandes que, após aprovado pelo Senado Federal, foi a sanção do Poder Executivo.
Iniciando a análise, a principal mudança ocorre nos incisos do artigo 3º-A. No caput, aponta-se a obrigatoriedade de se manter boca e nariz cobertos por máscara de proteção individual, conforme a legislação sanitária e na forma de regulamentação estabelecida pelo Poder Executivo federal, para circulação em espaços públicos e privados acessíveis ao público, em vias públicas e em transportes públicos coletivos, bem como em veículos de transporte remunerado privado individual de passageiros por aplicativo ou por meio de táxis, além de ônibus, aeronaves ou embarcações de uso coletivo fretados.
O inciso III, que dispunha pela utilização obrigatória de máscaras em estabelecimentos comerciais e industriais, templos religiosos, estabelecimentos de ensino e demais locais fechados em que haja reunião de pessoas, foi vetado pelo Executivo, igualmente em relação ao seu parágrafo primeiro, que previa a aplicação de multas pelo descumprimento das determinações em questão.
Igual condição se observa dos parágrafos segundo, terceiro, quarto, quinto e sexto, também vetados, que indicavam sobre a regulamentação da norma; o fornecimento de máscaras por parte do Poder Público; a forma para aquisição de máscaras e aqueles em situação de vulnerabilidade e suas peculiaridades.
Por sua vez o parágrafo sétimo determina que a obrigação prevista no caput deste artigo (utilização de máscaras) será dispensada no caso de pessoas com transtorno do espectro autista, com deficiência intelectual, com deficiências sensoriais ou com quaisquer outras deficiências que as impeçam de fazer o uso adequado de máscara de proteção facial, conforme declaração médica, que poderá ser obtida por meio digital, bem como no caso de crianças com menos de 3 (três) anos de idade. Segue o parágrafo oitavo indicando que as máscaras a que se refere o caput deste artigo podem ser artesanais ou industriais.
O artigo 3-B, que determinava que os estabelecimentos em funcionamento obrigavam-se ao fornecimento gratuito de máscaras aos colaboradores e funcionários; os parágrafos primeiro, segundo, terceiro e quarto, que regulamentavam a norma; aumentavam o espectro do caput aos órgãos públicos e indicavam que a aquisição das máscaras para distribuição fossem preferencialmente adquiridas de costureiros ou produtores locais, foram igualmente vetados.
Restou como única obrigação aquela posta no parágrafo 5º, onde preconiza que os órgãos, entidades e estabelecimentos a que se refere este artigo deverão afixar cartazes informativos sobre a forma de uso correto de máscaras e o número máximo de pessoas permitidas ao mesmo tempo dentro do estabelecimento, nos termos de regulamento.
O parágrafo sexto que determinava a restrição de entrada ou retirar de suas instalações que infringiam as disposições do artigo 3-A, foi igualmente vetado, assim como os artigos 3-C e 3-D, que albergavam a aplicação de multas e a destinação dos valores dela decorrentes.
O artigo 3º-E aponta que é garantido o atendimento preferencial em estabelecimentos de saúde aos profissionais de saúde e aos profissionais da segurança pública, integrantes dos órgãos previstos no art. 144 da Constituição Federal, diagnosticados com a Covid-19, respeitados os protocolos nacionais de atendimento médico.
Por sua vez, o artigo 3º-F determina como obrigatório o uso de máscaras de proteção individual nos estabelecimentos prisionais e nos estabelecimentos de cumprimento de medidas socioeducativas, observado o disposto no caput do art. 3º-B desta Lei."
"Sequencialmente, o artigo 3º-G objetiva as concessionárias e empresas de transporte público, as quais deverão atuar em colaboração com o poder público na fiscalização do cumprimento das normas de utilização obrigatória de máscaras de proteção individual, podendo inclusive vedar, nos terminais e meios de transporte por elas operados, a entrada de passageiros em desacordo com as normas estabelecidas pelo respectivo poder concedente. Em seu parágrafo único, o poder público concedente regulamentará o disposto neste artigo, inclusive em relação ao estabelecimento de multas pelo seu descumprimento.
Nos ditames do artigo 3º-H, os órgãos e entidades públicos, por si, por suas empresas, concessionárias ou permissionárias ou por qualquer outra forma de empreendimento, bem como o setor privado de bens e serviços, deverão adotar medidas de prevenção à proliferação de doenças, como a assepsia de locais de circulação de pessoas e do interior de veículos de toda natureza usados em serviço e a disponibilização aos usuários de produtos higienizantes e saneantes.
Vetados também o parágrafo único do dispositivo anterior e o artigo 3º-H, os quais albergavam a aplicação de multas aos estabelecimentos que, autorizados a funcionar, deixassem de disponibilizar álcool em gel a 70% (setenta por cento) e a obrigatoriedade do Poder Público de veicular campanhas publicitárias de interesse público que informassem a necessidade do uso de máscaras de proteção individual, bem como a maneira correta de sua utilização e descarte, respectivamente. Para finalizar, o artigo 4º determina que esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
Demonstrados os dispositivos vetados e vigentes da lei em análise, destaca-se que, em julgamento realizado no dia 15 de abril, o Supremo Tribunal Federal – STF confirmou competência concorrente de estados, Distrito Federal, municípios e União, em ações para combater a pandemia ocasionada pela disseminação do novo coronavírus, por meio de referendo de medida cautelar concedida na Ação Direta de Inconstitucionalidade – ADI 6.341, proposta pelo Partido Democrata Trabalhista, que tem como relator o Ministro Marco Aurélio Mello e na qual se discute a constitucionalidade de dispositivos da Lei Federal nº 13.979/2019, que trata das medidas para enfrentamento da COVID-19, acrescidos pela Medida Provisória – MP nº 926/2020.
No entendimento do autor da referida ADI, a MP em tela atenta contra a competência de estados, municípios e Distrito Federal ao estabelecer que apenas a União teria poderes para decretar políticas de combate à disseminação da doença e determinar a exclusividade do Poder Executivo para apontar atividades consideradas essenciais a funcionar neste período de crise.
Ao referendar a medida cautelar, os ministros fixaram entendimento de que a lei em questão não afasta a competência de estados e municípios para a adoção de políticas públicas voltadas ao enfrentamento da pandemia, como o distanciamento social ou a quarentena, zelando pela preservação da autonomia constitucional dos entes federativos em questão. Ademais, houve entendimento também de que o Presidente da República poderá dispor, mediante decreto, sobre os serviços públicos e atividades essenciais no período da pandemia, desde que preservada a atribuição de cada esfera governamental.
Com base na citada decisão, governadores e prefeitos encontram-se legitimados também a adotar ações para o combate à pandemia, além de dispor sobre o funcionamento do comércio local.
Dentro de sua esfera de competência, no Estado de São Paulo vigoram o Decreto Estadual nº 64.959/20, publicado em 05/05/2020, que dispõe sobre o uso geral e obrigatório de máscaras de proteção facial no contexto da pandemia da COVID-19, além da a Resolução SS - 96, de 29-6-2020, da Secretaria da Saúde estadual, para fiscalização do uso correto de máscaras nos estabelecimentos comerciais, prestação de serviços, bem como pela população em geral, e dá providências decorrentes.
Na resolução em especial, fixa a possibilidade de lavratura de autos de infração para cada usuário existente no interior do estabelecimento no momento da fiscalização, e que não estiver utilizando a máscara cobrindo corretamente nariz e boca; aplicação de multa para a falta de sinalização nos estabelecimentos e para transeuntes que não estiverem usando as máscaras cobrindo corretamente o nariz e boca.
Os detalhamentos das disposições supramencionadas foram encaminhados a todos os sindicatos filiados através dos Mix Legais 137, de 07 de maio de 2020 e 193, de 01 de julho de 2020, respectivamente.
Em conclusão, muito embora tenha havido veto em dispositivos da Lei Federal nº 14.019, de 2 de julho de 2020, que determinavam a utilização de máscaras em estabelecimentos empresariais, conforme visto, vigoram no Estado de São Paulo normas que obrigam a utilização desses equipamentos, cujas quais deverão ser observadas para preservação da saúde, além de evitar a aplicação de multas por seu descumprimento.
Considerando a citada decisão do STF que fixou competências concorrentes, por maior segurança jurídica, as empresas deverão ainda observar a existência de supostas normas municipais que complementem ou regulamentem a utilização desses equipamentos de proteção durante o período da pandemia.