Através do Ofício Circular SEI nº 300/2023, publicado em de 22 de novembro, o Departamento Nacional de Registro Empresarial e Integração – DREI, firmou entendimento, para todas as Juntas Comerciais do Brasil, sobre a possibilidade ou não de constituição de sociedade com condomínio de cotas entre cônjuges casados entre si sob o regime de comunhão universal de bens.
Divergências acerca da matéria
O art. 977 do Código Civil, dispõe que os cônjuges casados no regime da comunhão universal de bens, ou no da separação obrigatória não podem contratar sociedade, entre si ou com terceiros.
O Manual de Registro de Sociedade Limitada, Anexo IV da IN DREI nº 81, de 2020, prevê:
“3.2. IMPEDIMENTOS PARA SER SÓCIO
A pessoa impedida por norma constitucional ou por lei especial não pode ser sócia de sociedade limitada.
São exemplos de impedimentos:
(...)II - os cônjuges casados em regime de comunhão universal de bens ou de separação obrigatória, não podem contratar sociedade, entre si ou com terceiros.”
Considerando as divergências acerca da matéria, o assunto foi discutido por juristas e publicado o seguinte enunciado pela III Jornada de Direito Comercial:
“Enunciado nº 94: A vedação da sociedade entre cônjuges contida no art. 977 do Código Civil não se aplica às sociedades anônimas, em comandita por ações e cooperativa.”
Ocorre que algumas Juntas Comerciais estavam aceitando o arquivamento de contratos sociais com condomínio de quotas por cônjuges proibidos pelo art. 977 do Código Civil, enquanto outras não aceitavam.
Com o objetivo de uniformizar e trazer segurança jurídica aos empresários foi que o DREI publicou o ofício 300/2023 com esclarecimentos e orientações sobre a impossibilidade de constituição de sociedades limitadas com a utilização de condomínio de quotas entre cônjuges casados sob o regime da comunhão universal de bens.
Portanto, se o empresário utilizar o tipo jurídico sociedade limitada, é vedada a constituição de sociedade entre cônjuges casados em regime de comunhão universal de bens ou de separação obrigatória, e também não podem contratar sociedade, entre si ou com terceiros.
Desta forma ficou esclarecido que o art. 977 do Código Civil faculta aos cônjuges contrataram sociedade, entre si ou com terceiros, desde que não sejam casados sob o regime da comunhão universal de bens ou da separação obrigatória. Referida regra tem como escopo evitar a confusão entre o patrimônio social e o conjugal, obstaculizando a fraude contra credores e aos regimes de bens.
Em seu ofício o DREI esclareceu que: O condomínio de quotas é um instituto jurídico previsto em lei e apto a solucionar uma série de questões. De fato, em que pese a indivisibilidade das quotas, o § 1º do art. 1.056 do Código Civil admite o condomínio formado por dois ou mais titulares de determinada quota. Tem-se, aqui, um condomínio voluntário.
Havendo condomínio de quotas, os direitos a elas inerentes serão exercidos por um dos condôminos, na qualidade de representante. No entanto, todos os condôminos devem figurar no contrato social como sócios, inclusive porque, como tais, respondem solidariamente pelas prestações necessárias integralização dessas quotas, e essa responsabilidade se dá em relação não apenas à sociedade, mas também em relação a terceiros (art. 1.056, § 2º, CC).
Essa necessidade dos condôminos figurarem como sócios no contrato social, por si só, já afastaria a possibilidade de se estabelecer condomínio de quotas entre cônjuges casados em comunhão universal. Afinal, eles não podem ser sócios em uma mesma sociedade limitada, em razão do disposto no art. 977 do Código Civil.
Portanto, essa "solução" que vem sendo praticada em alguns casos, com respaldo de algumas Juntas Comerciais, não encontra amparo no arcabouço normativo, trazendo insegurança para as partes que a adotam.
O ideal, neste caso, foi a regulamentação da questão pelo órgão competente – o DREI – Departamento Nacional de Registro Empresarial e Integração –, esclarecendo a impossibilidade dessa medida e orientando as Juntas Comerciais nesse sentido.
Não há que se falar em aplicação da autonomia privada da vontade ou intervenção subsidiária e excepcional do Estado sobre o exercício de atividades econômicas frente à Lei da Liberdade Econômica, na medida em que no caso em comento há uma expressa vedação legal para a contratação de sociedades limitadas entre cônjuges casados no regime da comunhão universal de bens, ou no da separação obrigatória.
O art. 4º da Lei da Liberdade Econômica é cogente ao dispor que é dever da administração pública, no exercício de regulamentação de norma pública, exceto se em estrito cumprimento a previsão explícita em lei, evitar o abuso do poder regulatório de maneira a, indevidamente introduzir limites à livre formação de sociedades empresariais ou de atividades econômicas (art. 4º, VII). No caso há expressa vedação legal - art. 977 do CC.
Conclusões:
a) Ficou esclarecido que o art. 977 do Código Civil faculta aos cônjuges contrataram sociedade, entre si ou com terceiros, desde que não sejam casados sob o regime da comunhão universal de bens ou da separação obrigatória. Referida regra tem como escopo evitar a confusão entre o patrimônio social e o conjugal, obstaculizando a fraude contra credores e aos regimes de bens;
b) Há impossibilidade de constituição de sociedades limitadas com a utilização de condomínio de quotas entre cônjuges casados sob o regime da comunhão universal de bens;
c) A vedação da sociedade entre cônjuges contida no art. 977 do Código Civil não se aplica às sociedades anônimas (Enunciado nº 94, da III Jornada de Direito Comercial do Conselho da Justiça Federal). Dispositivo semelhante também foi inserido também no Manual de Registro de Cooperativa.
d) As sociedades constituídas antes do início da vigência do atual Código (11/01/2003) não foram atingidas, dado o princípio da preservação do ato jurídico perfeito, inserido no art. 5º, XXXIV, da Constituição, como o reconhecido pelo antigo DNRC (atual DREI) - Parecer DNRC/Cojur nº 125/2003, descartada, então, a necessidade de alteração do quadro social ou do regime de bens adotado;
e) As Juntas Comerciais realizam as atividades de registro empresarial em cada Estado da Federação, sendo que estão subordinada tecnicamente ao DREI que uniformiza os entendimentos na forma de ofícios circulares, sendo de grande relevância sua atividade para a preservação da segurança jurídica e da uniformidade dos atos registrados nestes importantes órgãos de regularização de novos empreendedores, bem como pelas alterações de seus registros.