Foi publicado no Diário Oficial da União de hoje, 10/03/2022, o texto da Lei nº 14.311, de 9 de março de 2022, que altera a Lei nº 14.151, de 12 de maio de 2021, para dar nova disciplina ao afastamento do trabalho presencial da empregada gestante, inclusive a doméstica, não imunizada contra o coronavírus, quando a atividade por ela exercida for incompatível com a sua realização em domicílio, seja por meio de teletrabalho, trabalho remoto, ou outra forma de trabalho a distância, além de contemplar a permissão para o retorno às atividades presenciais dessas empregadas, com o ciclo vacinal completo, bem como para estabelecer em que condições isso poderá ocorrer.
Como é de conhecimento, a lei anterior deixou muitas dúvidas e até lacunas acerca da implementação do afastamento, o que se procurou corrigir com a nova lei.
Destacamos abaixo seus principais aspectos:
Quem deve ser afastada (gestantes não imunizadas)
A alteração mais importante já vem enunciada no caput do art. 1º da nova lei. Enquanto a lei anterior impunha o afastamento de toda empregada gestante, a nova disposição determina o afastamento apenas daquela que ainda não tenha sido totalmente imunizada contra o coronavírus SARS-CoV-2, o que significa não haver completado o ciclo de vacinação conforme recomendação do Ministério da Saúde.
Que atividades poderão ser exercidas e possibilidade de alteração de função
Durante o afastamento, a empregada ficará à disposição do empregador para exercer as atividades em seu domicílio, por meio de teletrabalho, trabalho remoto ou outra forma de trabalho à distância, sem prejuízo de sua remuneração.
Quanto às atividades, se as funções já exercidas pela empregada de forma presencial puderem ser desempenhadas à distância, não há que se falar em alterações. No entanto, na maioria das vezes isso não é possível, como é o caso, por exemplo, das operadoras de caixa. Nesse caso, o empregador poderá alterar as funções de forma a compatibilizá-las com o trabalho à distância, desde que respeitadas a competência para seu desempenho e as condições pessoais da empregada. Isso leva em conta, portanto, a capacidade para execução do serviço e condições de saúde.
Condições para o retorno à atividade presencial
Salvo se o empregador optar por manter o exercício das atividades à distância, a empregada deverá retornar à atividade presencial nas seguintes hipóteses:
Termo de responsabilidade pela não vacinação
Se os dois primeiros itens não dão margem a dúvidas, o item III, ao contrário, é um dos aspectos mais polêmicos da lei.
Com efeito, o texto estabelece que a empregada gestante deverá assinar termo de responsabilidade, de livre consentimento, para o exercício do trabalho presencial, comprometendo-se a cumprir todas as medidas preventivas adotadas pelo empregador.
Dispõe, ainda, que o exercício dessa opção é uma “expressão do direito fundamental da liberdade de autodeterminação individual, e não poderá ser imposta à gestante que fizer a escolha pela não vacinação qualquer restrição de direitos em razão dela”.
Sobre esse aspecto, o STF firmou, ainda no ano passado, entendimento de repercussão geral (ARE 1267879), mediante o qual entendeu ser constitucional a obrigatoriedade da vacinação, ao mesmo tempo em que estabeleceu, nas ADIs 6586 e 6587, que essa compulsoriedade “não deve ser confundida com vacinação forçada”, sendo ainda legítimas “consequências práticas na vida privada do cidadão que se recusar a aderir à campanha nacional de imunização”.
Entendemos que, longe de esclarecer, a Suprema Corte tornou ainda mais confuso o entendimento, até porque, se a Lei nº 13.979, de 6 de fevereiro de 2020, que dispõe sobre as medidas para enfrentamento da emergência de saúde pública, contém previsão para que as autoridades competentes adotem a vacinação obrigatória, isso até o momento não aconteceu.
O assunto ganha dimensão ainda maior dentro do contexto do Direito do Trabalho, considerando-se o conceito de doença ocupacional. O STF, no julgamento das ADIs em que se discutia a constitucionalidade da MP 927/2020, acolheu a suspensão da eficácia do art. 29 daquela MP, que estabelecia (diga-se, corretamente) que os casos de contaminação pelo coronavírus não seriam considerados ocupacionais, exceto mediante comprovação do nexo causal, transferindo assim o ônus da prova ao empregador. Tal princípio vai em sentido contrário às disposições da legislação previdenciária e às experiências relacionadas às epidemias anteriores.
A fim de orientar o empregador com relação ao termo de compromisso, encaminhamos por anexo, um modelo para que, querendo, as empresas possam dele se utilizar. Esta questão poderá, ainda, vir a ser objeto das próximas negociações coletivas, garantindo maior segurança jurídica às partes envolvidas.
O Executivo vetou disposição que permitiria o enquadramento das gestantes afastadas – quando impossível a realização de trabalho a distância – em uma das hipóteses permissivas para a concessão do salário-maternidade.
A FecomercioSP entende que esse era um dos pontos essenciais para o setor produtivo, especialmente para as micro e pequenas empresas, cujos postos de trabalho no segmento do comércio varejista, por exemplo, são ocupados, na maioria das vezes, por mulheres que, vale mencionar, são, junto com os empregadores, as mais prejudicadas.
Muito embora a Lei já esteja surtindo efeitos jurídicos, vamos acompanhar e nos manifestar junto ao Congresso Nacional para que haja a derrubada do veto, notadamente sobre este ponto do enquadramento das gestantes afastadas do trabalho quando a sua função se mostrar incompatível com a realização de trabalho em domicílio.
Por fim, enquanto os vetos não forem analisados pelo Congresso Nacional, a FecomercioSP vislumbra que muitas ações judiciais serão ajuizadas pelos empregadores, além das que já o foram, no sentido de que decisões judiciais direcionem as gestantes à Previdência Social quando impossível a realização do trabalho nas formas anteriormente mencionadas.
Num momento em que as entidades sindicais estão empenhadas na busca por associados, o veto a dispositivos que obrigavam o INSS a pagar o salário-maternidade, desonerando as empresas do pagamento dos salários durante o afastamento do trabalho presencial, abre uma excelente oportunidade aos sindicatos patronais para ingressarem com ações coletivas em benefício de seus associados visando à desoneração das empresas do pagamento de salários durante o afastamento das gestantes.
Isto porque a Justiça Federal tem decidido a favor das empresas e contra o INSS em muitas ações com pleitos nesse sentido, como é o caso de ações movidas em SP, Minas Gerais, Paraná, Santa Catarina, Rio Grande do Sul e Pará, já havendo decisões inclusive em 2ª Instância, favoráveis às empresas, sendo esta uma ótima oportunidade que se abre aos sindicatos patronais para granjear novos associados. Informamos a seguir alguns processos com decisões favoráveis às empresas:
Em conclusão, ainda que o texto sancionado tenha implementado importantes melhorias em relação à lei anterior, ainda não traz segurança jurídica nem aos empregadores nem às trabalhadoras, ao não contemplar a possibilidade de se conceder o salário maternidade às empregadas que não podem exercer suas atividades remotamente.
Posicionamento e próximos passos
Além da possibilidade de alteração de funções, o enquadramento das gestantes em uma das hipóteses de concessão do salário-maternidade era um dos pleitos da Fecomercio/SP, do Conselho de Emprego e Relações do Trabalho e do Comitê Trabalhista Sindical, que discutiram e elaboraram propostas de emendas que foram apresentadas nas reuniões e audiências públicas com os Senhores Parlamentares e, recentemente, por meio do encaminhamento de ofícios.
Com o veto a esse item tão importante ao setor produtivo, a matéria será devolvida ao legislativo que, por meio de sessão conjunta do Congresso Nacional, deverá formar Comissão Mista para emissão de parecer. O prazo para que ocorra essa sessão conjunta é de trinta dias.
Trata-se de situação delicada, pois para a votação é exigido quórum de maioria absoluta dos Deputados (257 votos) e Senadores (41), em votação nominal. Acaso alguma destas Casas não atinja o quórum, o veto é mantido.
Anexo: modelo de termo de compromisso.
Sugestão do Termo de Responsabilidade:
TERMO DE RESPONSABILIDADE E CONSENTIMENTO
PARA EXERCÍCIO DO TRABALHO PRESENCIAL
(Lei Federal nº 14.311/2022)
IDENTIFICAÇÃO DA EMPREGADA: (Nome, CTPS e CPF)
IDENTIFICAÇÃO DO EMPREGADOR: (Razão Social, CNPJ)
Eu, _______ (nome completo da empregada), declaro que, no exercício do meu direito fundamental da liberdade de autodeterminação individual, fiz a opção de não me vacinar contra o coronavírus SARS-CoV-2, mesmo diante dos riscos envolvidos. Assim sendo, venho, através deste termo, ratificar meu consentimento, de livre e espontânea vontade, em retornar ao trabalho presencial, assumindo todas as responsabilidades decorrentes da não imunização, em cumprimento ao disposto no artigo 1°, § 6°, da Lei n° 14.151/21, na redação dada pela Lei nº 14.311/22. Declaro, ainda, que me comprometo a cumprir todas as medidas e protocolos sanitários determinados e implantados por meu empregador com base na Portaria Conjunta SPREV/ME/MS n° 020/2020 e demais medidas que forem determinadas pelas autoridades sanitárias.
DATA
ASSINATURA DA EMPREGADA