04/06/2021 - Sancionado Marco Legal das Startups
Foi publicada no Diário Oficial da União na data de hoje, a Lei Complementar Nº 182, de 1º de junho de 2021, que institui o Marco Legal das Startups e do empreendedorismo inovador; e altera a Lei Nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976, e a Lei Complementar Nº 123, de 14 de dezembro de 2006.
A sanção do Marco Legal das Startups representa o primeiro avanço para o desenvolvimento de políticas públicas em prol do ecossistema de inovação no país. Além disso, a legislação possibilita que novos negócios desfrutem de um ambiente mais livre e simplificado para a experimentação de produtos e serviços no mercado.
Além disso, o Marco Legal legitima a importância da tecnologia e da inovação promovidas por estas companhias, abrindo frentes para uma expansão de negócios nos mercados interno e externo, preenchendo lacunas e entraves na regulação das leis até aqui vigentes.
No entanto, o artigo que tratava da possibilidade de perdas entrarem no cálculo do ganho de capital a se declarado pelo investidor anjo foi vetado. Tal mecanismo permitia a diminuição da base de cálculo do imposto sobre a renda em casos de apuração do ganho de capital, mesmo procedimento adotado pelos investidores em ações de empresas de capital aberto. A FecomercioSP lamenta que um dos poucos incentivos que a lei trazia foi vetado no momento da sanção. É mais um tema que deverá ser acrescentado em discussões futuras.
Em linhas gerais, a sanção e a publicação da Lei Complementar são muito positivas, mas representam apenas o primeiro passo de um trabalho que está só começando. O Marco Legal das Startups ainda precisará de regulamentação em vários sentidos e precisamos estar atentos para garantir que essas iniciativas serão feitas de acordo com as necessidades dos empreendedores. Além disso, é necessário lembrar que muitos pleitos do ecossistema ainda precisam ser endereçados em novos Projetos de Lei, como discutido durante a tramitação do Marco Legal.
Entenda os principais pontos aprovados no Marco Legal das Startups:
- Definição e enquadramento de startups: o projeto aprovado estabelece os critérios de enquadramento do marco legal das startups, o que proporciona segurança jurídica para eventuais leis que venham a ser criadas em âmbito estadual e municipal. De acordo com a lei, são consideradas startups as empresas de inovação que tenham tido receita bruta anual de até R$ 16 milhões no ano anterior, com até dez anos de inscrição no CNPJ. Também serão consideradas startups aquelas empresas que estejam enquadradas no regime especial do Inova Simples (art. 65-A da LC 123/2006) e/ou declararam em seus atos constitutivos que são um modelo inovador de negócio.
- Mais segurança jurídica para investimento em inovação: além de conceituar investidor-anjo, e trazer modalidades e aporte de capital comuns em startups, como o Contrato de Mútuo Conversível, o Marco traz uma proteção ao investidor. Assim, as startups poderão admitir aporte de capital por pessoa física ou jurídica, podendo resultar ou não em participação no capital social. O investidor que realizar esse aporte de capital não responderá por qualquer dívida da empresa nem com os próprios bens (desconsideração da personalidade jurídica), exceto em casos de dolo, fraude ou simulação de investimento. Também não possuirá gerência ou voto na administração da empresa, mas pode atuar como mentor na tomada de decisão, acompanhando de perto o desenvolvimento do negócio. Este ponto se apresenta como uma grande vantagem aos interessados em investir nessas empresas, considerando que, por natureza, já é de alto risco, beneficiando as próprias startups. Somente serão considerados quotistas, acionistas ou sócios, os investidores que formalmente efetuem este tipo de participação societária.
- Ambiente regulatório experimental – sandbox regulatório: o Marco Legal traz esse instrumento que possibilita as pessoas jurídicas testarem projetos inovadores, com consumidores reais, sujeitando-se aos requisitos estabelecidos previamente pela entidade reguladora. Ao dispor sobre o funcionamento do programa experimental, o órgão regulador deverá estabelecer os critérios para seleção ou para qualificação do regulado, a duração e o alcance das normas. Isso proporcionará melhores possibilidades de êxito no crescimento e na consolidação das startups, além de permitir que o poder público possa testar a inovação antes da tomada de decisão.
- Incentivo à contratação, pela administração pública, de soluções inovadoras elaboradas ou desenvolvidas por startups: o texto sancionado estabelece uma modalidade especial de concorrência para startups. Assim, a administração pública poderá restringir licitações que visam à contratação de soluções inovadoras apenas para este tipo de empresa. Além disso, as propostas serão julgadas por um servidor público e um professor de instituição pública de ensino superior da área, levando em conta alguns critérios estabelecidos no marco, como por exemplo, a viabilidade e a maturidade do modelo de negócio de solução e o potencial de resolução do problema pela solução proposta. Reconhece-se aqui o papel do Estado no fomento à inovação e as potenciais oportunidades de economicidade, de benefício e de solução de problemas públicos com soluções inovadoras, e, em contrapartida, as startups terão acesso ao poder de compra do Estado, aumentando o faturamento. Além disso, o Marco prevê pagamento antecipado à startup vencedora para que possa iniciar o trabalho, sem, no entanto, definir a porcentagem no valor do adiantamento.
- Modificações na lei de sociedade por ações – S/A: com o marco legal das startups, foram introduzidas algumas modificações na constituição e funcionamento de uma Sociedade por Ações – S/A, viabilizando uma estruturação mais simples e diminuindo custos. As alterações mais expressivas foram a mudança no mínimo de diretores da sociedade anônima de dois para um e a possibilidade de publicação de forma eletrônica, de convocações, atas e demonstrações financeiras, além da substituição de livros por registros mecanizados ou eletrônicos, para a companhia fechada com receita bruta anual de até R$ 78 milhões.
Propostas do ecossistema que ficaram de fora do Marco Legal das Startups:
- Regulação das stock options para que não haja tributação na sua concessão, mas somente no eventual ganho de capital: as stock options é um instrumento que tem como objetivo reter talentos na empresa, já que permite a opção de compra de ações da empresa pelo funcionário a um preço pré-determinado. O texto inicial do PL 146/2019 tratava do dispositivo das stock options. O dispositivo acabou saindo do texto quando da votação pelo Senado Federal. De acordo com o relator do Projeto no Senado, Carlos Portilho, o instrumento não é exclusivo das startups e a questão demanda tratamento de forma mais ampla, em legislação própria e exclusiva. O Comitê Startups entende que, da forma como estava, o dispositivo era prejudicial às startups, porque implicava em aumento da tributação sobre as opções ao reconhece-las como de natureza remuneratória. Assim, iriam incidir sobre as opções encargos trabalhistas e contribuições previdenciárias, incorrendo em gastos tanto para as startups como pelos empregados. O ideal é que se tenha um texto que garanta que as opções sejam de natureza mercantil, tributadas apenas com ganho de capital no momento o exercício da opção.
- Equiparação de tratamento tributário do investimento em startups e promoção de políticas de estímulo: O Comitê Startups da FecomercioSP tem como proposta o estabelecimento de uma tributação diferenciada para investimentos feitos em startups, na forma da lei, equiparando tal tributação aquela incidente sobre Letras de Crédito Imobiliário – LCIs e Letras de Crédito do Agronegócio – LCAs, e outro que isente de tributação a remissão de dívida em mútuos conversíveis realizados entre pessoas físicas e startups. As duas opções de investimento são isentas da cobrança do Imposto de Renda. Enquanto isso, a tributação do investimento anjo varia entre 15%.e 22,5% sobre o ganho de capital.
- Possibilidade de enquadramento das sociedades anônimas no Simples Nacional: sociedades anônimas não podem se enquadrar o Simples, mesmo que estejam dentro das faixas de faturamento pedidas pelo regime tributário. Essa impossibilidade torna as simplificações das S/As propostas pelo Marco Legal inócuas para startups. Ao se tornarem S/As, elas perdem o benefício fiscal do Simples. Além disso, outros requisitos do Simples Nacional prejudicam a adesão das startups ao regime tributário, como a própria possibilidade de se organizar como S/A e a vedação de sócios estrangeiros ou pessoas jurídicas, por exemplo.
Outro pontos também não foram abordados pelo Marco Legal, tais como: alíquotas diferenciadas para Fundos de Investimento em Participações que investissem em startups; linhas de crédito diferenciadas, oferecidas pelos bancos públicos, para empresas classificas como startups; e dedução do imposto de Renda devido no caso de valores despendidos a título de patrocínio ou doação realizada diretamente a startups.
O Marco Legal das Startups, impulsionando a produtividade e competitividade no ambiente de negócios nacional, é o primeiro passo de uma série de conquistas que o segmento de inovação brasileiro ainda precisa obter, de modo que sejam criadas políticas públicas para incentivar a criação e o desenvolvimento de empresas inovadoras. Para tanto, é preciso seguir dialogando com o legislativo e executivo para o desenvolvimento de politicas públicas de incentivo ao empreendedorismo de inovação no país.